Todas essas palavras.




Ensine-me.
Mostre-me.
Guie-me.

Ela está parada diante da folha em branco há mais de dez minutos, esperando por algo que talvez não aconteça. É uma sensação parecida aos instantes que precedem o beijo, porque você consegue sentir a proximidade da boca mas não é capaz de avaliar a profundidade do toque está prestes a ocorrer.

O relógio em um dos cantos do quarto indica a hora precisa, três e trinta e três da manhã. Ela não sabe exatamente por que ainda está acordada, talvez por tudo ser mais silencioso agora, talvez para esquecer que está sozinha ou porque deseja ficar sozinha.
Enquanto gira a caneta entre os dedos com a mão pousada sobre a folha de papel, ela tenta sem sucesso encontrar a resposta sobre sua insônia; procura com veemência descobrir porque está ali. A verdade é simples, ela está acordada porque deseja realmente despertar.

Sente que precisa lembrar, que algo está fora de seu lugar e esse algo deve ser ela.
Só pode ser ela.

Ao menos uma delas... uma das infindáveis personagens que dividem simultaneamente espaço dentro dela e que esperam para sair, ansiosas por povoar o vazio das linhas não preenchidas. Ávidas para conceder vida a todas aquelas palavras que ainda não foram ditas.

Deus já foi ela.
Até os homens afirmarem que ela não tinha mais alma.
Eu já fui dela.
Até deixar de ser eu.
Ela já foi amada, esquecida, sonhadora, destruidora, completa e imperfeita.
Ela mantém em si o poder de ser todas elas.
Isso me fascina.

Isso faz ela ser.
Todas essas palavras.

Comentários