Cena 2

Ouve-se um barulho de ônibus saindo. As luzes se acendem. É uma luz branca de aspecto pobre de banheiro de rodoviária.

Logo abaixo, há um balcão com duas pias, onde um homem se debruça.

É Roberto. Ele tem as costeletas úmidas de suor. Passa a mão pelo rosto e levanta os olhos para se olhar no espelho. Interrompe sua respiração ofegante, e por fim suspira. Afrouxa o colarinho da camisa e arregaça as mangas. Mergulha as mãos em concha na pia e molha os cabelos. Com o toco de sabão enegrecido, ensaboa o pescoço, os braços. Depois do banho de gato, ajeita os cabelos, apruma-se novamente e sai.

O barulho das portas e a mudança de ambientes é marcada pela luz e sonoplastia. As placas “4” e “5” que vem de cima indiciam a plataforma.

Do rádio de dentro do restaurante, ouve-se Bush, ao longe.

É dia lá fora. O sol do meio de tarde faz com que Roberto cerre os olhos. Ele procura pelo celular que toca no seu bolso. Vê quem é.

Roberto – Fala Arthur!... Tô na Dutra, voltando já, parei num posto aqui em Resende – ele ri, em desespero – Era a porra do isqueiro do Mariguella! – leva a mão ao rosto – sei lá “como” porra, só sei que os isqueiros se encontraram!

Roberto ouve a resposta e assente ansioso.

Roberto – Eu acabei de voltar, já falei com o cara, ofereci pra comprar de volta, oferei uma grana, não querem saber! Vão pôr a gente na justiça, criminal até, falsificação, falsidade ideológica e o caralho... – leva a mão ao rosto e deixa.

Roberto – Eu sei... Eu sei... Não adianta, não quer não quer, vamo pro pau... Beleza Arthur... A gente segura essa, meu velho... Tô chegando.

Desliga o celular e suspira novamente. Vira-se, e quando faz menção de guarda-lo, uma figura surge da parte escura da rodoviária.

Vem gingando, quando chega à luz – é um homem. De jeans escuro, jaqueta dos anos 80, cinto e sapatos gastos.

Homem – Por favor, companheiro – Roberto se vira com desconfiança – A bateria do meu celular acabou (meu celular morreu), poderia me emprestar o seu pra eu mandar uma mensagem?

Roberto lhe oferece o celular, indiferente, e anda em semi-círculos, passando a mão no cabelo, absorto em seus pensamentos. O homem envia a mensagem e lhe devolve o celular.

Homem – Muito obrigado – com ênfase no “muito”, e volta para as sombras.

Roberto fica olhando o homem partir, perdido na insolubilidade de seus próprios problemas. Finalmente, meneia a cabeça e inspira uma boa dose de ar, encerrando a questão.

Quase por acaso, ao invés de guardar no bolso abre seu celular.

“Mensagem Apagada” – e vai para a tela inicial.

Mensagens – Restaurar”.

“Tô excitado no ônibus. Tô na parada já, chegando... Me espera”.

Roberto solta um suspiro cômico de incredulidade. Põe o aparelho no bolso. E sai.

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