Calos



art by *Justin-ps



Tenho as mãos cheias de calos.
Não sou estivador, pedreiro ou faço outro tipo de trabalhador braçal.
Consegui esses calos quando entregava lanches para uma cafeteria em uma bicicleta velha e pesada. Aumentei-os com jogos de basquete, treinos de artes marciais e trabalhando como barista em torradores e máquinas de café.
Hoje eles são parte da minha identidade. Como um traço de personalidade ou uma característica física.
Traduzem uma parte do meu caráter. A manifestação física de como a vida pode nos calejar. E como a pele rija pode nos proteger de novos danos.
 
E fica tudo mais áspero nesses dias em que o inverno insiste em fazer participações especiais na primavera e o frio seca tudo ao redor.
Arranho a pele apenas por esfregar os olhos ao acordar.
Toco uma sinfonia a cada passada de mão em tecidos e superfícies.
 
Sei que existem cremes e tratamentos dermatológicos que podem amenizar tudo isso.
Luvas e lixas podem disfarçar a situação.
Mas nada disso é eficaz.
 
O melhor tratamento para a calosidade palmatória está em outra mão!
 
Outros dedos enlaçados, como dois corpos, se envolvendo, dançando.
Outra pele, em outra temperatura.
Sentir os movimentos da mão contrária, completando, pulsando... sentir tudo,  mesmo com camadas de pele grossa separando.

 
Tenho as mãos cheias de calos.
Meu hidratante são as mãos que sentem além da epiderme



Texto: Danilo Lodi
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Comentários

Ana Téjo disse…
Bonito isso... gostei!
Juliana Geve disse…
Muito bonito isso.
Sensível, delicado... e calejado ao mesmo tempo.
Gostei!
Juliana Geve disse…
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