Photo by gollum42
Os vidros... Para ele os vidros eram a pior parte.
Não era fácil carregá-los sem quebrar e, assim como em todas as outras vezes, demorava muito tempo limpá-los das marcas de sangue.
Mesmo deixando-os de molho sob a água... Mesmo que ele não deixasse as manchas secarem, não fazia qualquer diferença, ainda era necessário esfregar vigorosamente.
Essa era uma das três principais coisas que ele tinha aprendido sobre a guerra.
O sangue tinha um cheiro único, ferroso e amargo.
Parecia-lhe um tipo de perfume barato.
Não foram poucas as vezes em que ele imaginou ter enlouquecido por perceber-se cheirando o ar em volta de outra pessoa, apenas para saber se ela tinha esse mesmo cheiro horrível de morte que, para ele, estava associado ao sangue.
Desde que a guerra começou parecia-lhe tão difícil encontrar alguém que não carregasse consigo esse fedor... E o mais assustador, sem dúvida, era pensar que havia algum conforto nessa afirmação, afinal, para ele pessoas boas não cheiravam a sangue.
O outro problema, mencionado entre as três coisas, era a sujeira. Persistente, impregnada nas pontas de seus dedos enrugados pela água.
Aquelas marcas eram testemunhos vivos de como ele tentava, obsessivamente, limpar toda comida e roupas que tinha conseguido para sua família. Matar nunca era algo limpo.
De pé sob uma luz fraca e improvisada, diante do fio de água corrente, esfregando e esfregando. Cada centímetro. Esfregando e esfregando, sem pensar muito.
A concepção de ter tornado-se capaz de executar essa tarefa com certa precisão e eficácia ainda o horrorizava, mas, definitivamente, não tanto quanto antes.
Desde que a guerra começou tantas coisas tinham mudado.
Quando finalmente deu-se por satisfeito com o aspecto limpo daqueles itens, ele colocou tudo dentro de uma cesta.
O relógio em seu bolso marcava vinte e três horas, era preciso apressar-se para não ser visto por uma patrulha, ou pior, ser pego no meio do fogo cruzado.
Isso seria inaceitável, morrer era uma opção inaceitável. Elas precisavam dele, esposa e a filha dependiam dele.
Depois de caminhar por quase uma hora ele chegou até sua antiga casa.
Ficou parado, na rua, olhando para as janelas e pensou se sua alguém ainda rezava por seu nome na igreja. Aproximou-se, sem fazer barulho, e deixou a cesta de comida escondida perto da porta, onde sabia que sua esposa a encontraria.
Havia carne desidratada, feijão em lata, algumas conservas e presunto, além disso, tinha conseguido uma barra de chocolate. Não podia evitar de pensar em como sua menina ficaria feliz com o doce.
Não era fácil carregá-los sem quebrar e, assim como em todas as outras vezes, demorava muito tempo limpá-los das marcas de sangue.
Mesmo deixando-os de molho sob a água... Mesmo que ele não deixasse as manchas secarem, não fazia qualquer diferença, ainda era necessário esfregar vigorosamente.
Essa era uma das três principais coisas que ele tinha aprendido sobre a guerra.
O sangue tinha um cheiro único, ferroso e amargo.
Parecia-lhe um tipo de perfume barato.
Não foram poucas as vezes em que ele imaginou ter enlouquecido por perceber-se cheirando o ar em volta de outra pessoa, apenas para saber se ela tinha esse mesmo cheiro horrível de morte que, para ele, estava associado ao sangue.
Desde que a guerra começou parecia-lhe tão difícil encontrar alguém que não carregasse consigo esse fedor... E o mais assustador, sem dúvida, era pensar que havia algum conforto nessa afirmação, afinal, para ele pessoas boas não cheiravam a sangue.
O outro problema, mencionado entre as três coisas, era a sujeira. Persistente, impregnada nas pontas de seus dedos enrugados pela água.
Aquelas marcas eram testemunhos vivos de como ele tentava, obsessivamente, limpar toda comida e roupas que tinha conseguido para sua família. Matar nunca era algo limpo.
De pé sob uma luz fraca e improvisada, diante do fio de água corrente, esfregando e esfregando. Cada centímetro. Esfregando e esfregando, sem pensar muito.
A concepção de ter tornado-se capaz de executar essa tarefa com certa precisão e eficácia ainda o horrorizava, mas, definitivamente, não tanto quanto antes.
Desde que a guerra começou tantas coisas tinham mudado.
Quando finalmente deu-se por satisfeito com o aspecto limpo daqueles itens, ele colocou tudo dentro de uma cesta.
O relógio em seu bolso marcava vinte e três horas, era preciso apressar-se para não ser visto por uma patrulha, ou pior, ser pego no meio do fogo cruzado.
Isso seria inaceitável, morrer era uma opção inaceitável. Elas precisavam dele, esposa e a filha dependiam dele.
Depois de caminhar por quase uma hora ele chegou até sua antiga casa.
Ficou parado, na rua, olhando para as janelas e pensou se sua alguém ainda rezava por seu nome na igreja. Aproximou-se, sem fazer barulho, e deixou a cesta de comida escondida perto da porta, onde sabia que sua esposa a encontraria.
Havia carne desidratada, feijão em lata, algumas conservas e presunto, além disso, tinha conseguido uma barra de chocolate. Não podia evitar de pensar em como sua menina ficaria feliz com o doce.
Virou-se e, tão sutilmente quanto tinha aparecido, voltou a
sumir na noite.
Era melhor assim.
Não suportava a ideia de que sua esposa pudesse vê-lo.
Ele era outro homem.
Nem permitiria que ela percebesse o que ele havia feito nas últimas semanas, a cada vez que precisava sair para encontrar comida.
Era melhor assim... Ela simplesmente não precisava sentir a mesma culpa.
Nem perder a inocência.
Desde que a guerra começou ele compreendeu que a
inocência era uma das primeiras coisas que desapareciam nas pessoas. Era melhor assim.
Não suportava a ideia de que sua esposa pudesse vê-lo.
Ele era outro homem.
Nem permitiria que ela percebesse o que ele havia feito nas últimas semanas, a cada vez que precisava sair para encontrar comida.
Era melhor assim... Ela simplesmente não precisava sentir a mesma culpa.
Nem perder a inocência.
Sua esposa e filha precisavam de comida.
Não de um homem bom.
Bons homens eram, frequentemente, os primeiros a morrer na guerra.
...
Comentários