A vida sutil de um chinelo velho


Um chinelo velho.

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Um pé, um peso, uma história, uma pessoa.

Ele arrasta ou toca de leve, meio torto muitas vezes, suprimido, oprimido mais por um lado ou outro.

Questões que pesam sobre seu dono, hábitos, emoções e essa vira sua história também e sua marca.

Mas mesmo um chinelo "véio", aconchegante, macio, mas do tipo que se esconde das visitas (pelo menos as que se quer impressionar afinal ele pode ser interpretado como algo levemente broxante por homens ou mulheres. Mas a verdade é que são raras as visitas com quem podemos compartilhar uma calça desabotoada ostentando a barriga ou uma havaianas véia) carrega em si o ímpeto da imprevisibilidade. 

Mesmo a porra de um havaianas velha, fininha no calcanhar, surrada e encardida (porque convenhamos, nenhuma cândida no mundo a deixa branca novamente) carrega em si, o poder de mudar sua vida.

De te surpreender, deixa-lo num estado de presença e quase cú na mão caso resolva ir na padaria de chinelo ou mesmo dar uma de gringo e ir passear a pelo menos 5 km de casa e... Soltar, quebrar, gastar tanto com seus passos coesos ou não e romper a tira que sustenta sua base. 
E deixa-lo descalço em público em meio a estranhos, nú em sua alma. 

Como sua dignidade dependente de uma tira "véia" de uma havaianas"veia".

A nossa dignidade depende de coisas tão frágeis...Uma havaianas que não estourou em público e longe de casa, uma calça que não se rasga em publico bem na bunda (já me aconteceu), e acabamos tão tolerantes a tantas outras humilhações realmente graves. Mas isso é assunto para outro texto.

A questão é que a Havaianas "véia" aconchegante e feliz, abriga todo o mundo, desde o conforto de seus momentos mais solitários(aquela solidão gostosa de quando nos surpreendemos com o som de nossa própria risada celebrando nossa própria companhia e presença) às lembranças levemente tortas de castigos e chineladas na bunda. A havaiana "véia" representa seu eu mais íntimo, sua maior intimidade e ainda assim ela, pode te surpreender te deixando descalço no meio da rua de uma hora pra outra.

Tenha sempre bilhetes de metrô ou trocados nos bolsos.
Ou se preferir viver perigosamente ouça:

Sempre saiba que nem mesmo uma havaiana velha está sob o nosso controle.

E esta é a maior amargura e beleza da vida.

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